Esta exposição nasce do encontro de Joana Leal e Bruno Melo. A vontade de partilha e debate de vivências e expressões artísticas. A construção de uma amizade. Algum lugar em comum? Não se trata de ter ou não a mesma linguagem, trata-se do que existe antes disso: dois amigos que se acompanham na desconstrução ou reconstrução, no mínimo solene.

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Joana Leal, artista plástica.
Deixa assentar antes de beber

Esta casa está um caos, parece que por si só já quebra. O ambiente que a rodeia é altamente tóxico. Foi atingida por agentes mascarados, que estão à distância de um braço ou a milhares de quilómetros de distância. É melhor não olhar, nem para dentro nem para fora... Mas falam tão alto!... Se abrires os olhos vais ver muito, mas engasgas-te com frequência, ou então, ficas anestesiado automaticamente e atinges velocidades viciantes e inquestionáveis.

Primeira opção, a casa está a engasgar-se. Não consigo dar nome ao evento. É sobre o quê? Qual é o propósito? Na impossibilidade de se conseguir saber do que se trata, nadamos no incerto até acharmos um pedaço de terra firme. Sabes nadar? A casa ficou sem braços! Rendição, deixar apenas os sedimentos caírem.

Já se falou de tudo, não há nada para expor... Mas há tanto por dizer repetidamente para não cair no esquecimento. Mas há muito ruído lá fora! É forte demais, tem coisas a mais! Aceleradamente, contamina qualquer organismo vivo e este passa a formar parte da transmissão. Detetado no grau 4, a mancha de contágio é tão grande que se torna dominante, causando uma ofuscante alienação.

Imagina ficar parado, atento aos pequeníssimos movimentos internos e externos. O desmame é duro e causa dor. Permanecer atento ao que está dentro, escutar vagarosamente antes e depois de qualquer acontecimento externo e hidratar-se. Imagina ficar apenas parado, voltar ao pequeno, às conversas do tamanho de uma mesa, à presença sem subterfúgios.

Desassossego físico, confusão mental permanente, qualidade do que é lento, assentar o lugar, entregar os sedimentos, dispersão, entregar o que resta de momento. Ir com os sentidos abertos, ao mesmo tempo que não se sabe. Pode-se falar da beleza e da leveza da vida? Esquecer plateias. Tem qualquer coisa que nos distraia? Um aperitivo? A casa de muralhas de pele quer saber onde é a saída de emergência?

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Bruno Melo, artista plástico e arquiteto.
Vida em curso

2025 apresentou-se com novos desafios, a migração de projeto “Montado – geografia em mutação” por vários espaços expositivos e, principalmente, com a proposta de um grande desafio, sair do Porto para vir viver para Barrancos, deixar grande parte de uma construção de vida para erguer outra com fé no essencial. Desafio aceite! Processo de mudança e reconstrução em curso.

Dar materialidade a um corpo de obra para esta exposição foi mais uma bola do exercício circense em que se tornou 2025. Vir de um projeto estruturado como o do “Montado” e estar a viver um momento de tão grande transformação, levantou-me muitas questões do que queria eu comunicar com o meu trabalho. As seis horas de viagem que separam Barrancos do Porto foram momentos de silêncio, reflexão pessoal e encontros marcados com a Joana. Tudo estava a mudar... Em que espaço estou eu? Nestas viagens de dimensões múltiplas e simultâneas (até onde a imagem de um mesmo território estava a mudar, com o ciclo das estações do ano) foram-se criando imagens, abstrações de uma amálgama de realidades. Talvez seja este o corpo de obra que tenho a partilhar, desses caminhos, desse desfraldar de velas, desse suster de rédeas e ajuste de perna, na mudança de passos ou somente de uma vida em curso.